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Passeio de Moto pela Estrada Linha Bonita e Linha Nova: Encantos da Serra Gaúcha no Interior de Gramado – RS
16 de Fevereiro, 2021
Viva os encantos da Serra Gaúcha em um passeio de moto pela Estrada Linha Bonita, no interior de Gramado, RS. Casa Centenária da Família Ferrari, Moinho Colonial Cavichion e Marco Zero de Gramado.
Na terça-feira de Carnaval, partimos de Canela rumo ao interior de Gramado em um passeio de moto pela Estrada Linha Bonita. Pelo caminho, conhecemos a Casa Centenária da Família Ferrari, o Moinho Colonial Cavichion e a Linha Nova, berço da cidade e lar do marco zero e da primeira igreja. No retorno, passamos pela Rua Torta, provamos quitutes na Praça das Etnias e seguimos até Erechim, encerrando o dia com um pôr do sol memorável.

A terça-feira amanheceu envolta por uma densa névoa no centro de Canela, charmosa cidade da Serra Gaúcha conhecida por sua atmosfera acolhedora e arquitetura europeia.

Após um café da manhã reforçado, vestimos nossos trajes de viagem, organizamos as bagagens na Formosa e deixamos o hotel. Por ser início de manhã de uma terça-feira de Carnaval, o centro de Canela estava surpreendentemente silencioso, com poucas pessoas circulando.

Antes da chegada dos colonizadores, a área onde hoje estão Canela e Gramado era habitada principalmente pelos índios caingangues, que viviam nas densas florestas de araucárias. Esses povos eram habilidosos coletores de frutos e sementes e também caçadores, vivendo em harmonia com a natureza.

Em 1821, Joaquim da Silva Esteves recebeu da Coroa Portuguesa o título de primeiro proprietário da região, então batizada de “Campestre Canella”.

O nome faz referência a uma árvore caneleira que ficava próxima ao local onde hoje está a Praça João Corrêa. Essa árvore servia como ponto de referência e descanso para tropeiros que cruzavam a região.

O Coronel João Corrêa Ferreira da Silva, homenageado no nome da praça, foi um dos principais responsáveis pelo desenvolvimento do povoado e pela construção da estrada de ferro que ligou Canela a Taquara, iniciada por volta de 1913 e concluída em 1924.

Originalmente, toda a região era coberta por uma floresta de araucárias (Araucaria angustifolia), mas, entre as décadas de 1920 e 1950, a intensa atividade madeireira e a construção da ferrovia levaram à quase total devastação dessa vegetação.

Ainda assim, alguns exemplares centenários sobreviveram, podendo atingir até 1,5 metro de diâmetro. Muitos deles encontram-se no Parque Estadual do Caracol, criado em 1973 para proteger a mata nativa remanescente.

É nesse parque que está o maior cartão-postal de Canela: a imponente Cascata do Caracol, com seus 131 metros de queda livre. O nome do parque e do rio que o corta vem do formato sinuoso do leito, que visto de cima lembra a concha de um caracol.

Canela conquistou sua emancipação em 1944 e, atualmente, tem cerca de 45 mil habitantes. Sua economia é fortemente baseada no turismo, atraindo visitantes durante todo o ano com atrações naturais, culturais e gastronômicas.

Como já visitamos a cidade em diversas ocasiões (inclusive moramos nela por um período), desta vez nossa passagem foi breve. Limitamo-nos a percorrer de moto a área central, passando pela imponente Catedral de Pedra, um dos símbolos arquitetônicos mais conhecidos da Serra Gaúcha. Mesmo em uma visita rápida, foi possível reviver memórias e sentir novamente o charme que faz de Canela um destino tão especial.

Em seguida, deixamos o centro de Canela pela Avenida das Hortênsias, rumo a Gramado, em um trajeto de cerca de 7 quilômetros por uma via duplicada que, além de prática, oferece um visual encantador ao longo do caminho.

Gramado, assim como Canela, é um destino que já exploramos inúmeras vezes e que, por alguns anos, tivemos o privilégio de chamar de lar.

Em dezembro de 2019, Sayo e FredLee estiveram em Gramado e participaram do Tour Linha Bella, passeio turístico que percorre as áreas rurais do município.

A experiência permitiu um contato próximo com a cultura local, a hospitalidade típica da Serra Gaúcha e as paisagens campestres que ainda preservam traços do passado colonial.

Entre as lembranças daquela visita, a Estrada Linha Bonita se destacou. Trata-se de uma via asfaltada, estreita e sinuosa, que serpenteia pelo interior de Gramado e está cercada por um cenário de tirar o fôlego, composto por colinas verdejantes, lavouras e pequenas propriedades rurais.

Ao rever as fotos desse trajeto pitoresco, a Formosa não deixou de demonstrar certo “ciúme” por ainda não ter rodado por ali — e eu, confesso, compartilhei da mesma sensação.


Dessa vez, decidimos aproveitar a oportunidade para corrigir essa “injustiça” e partir de moto pela Estrada Linha Bonita, explorando suas curvas, a tranquilidade do interior e o charme das paisagens que revelam um lado de Gramado menos conhecido pelos turistas que se concentram apenas no centro da cidade.

Após percorrer cerca de 6 km a partir da Rua Coberta, no coração de Gramado, e descer mais de 200 metros de altitude, chegamos ao primeiro ponto de destaque da Estrada Linha Bonita: a Casa Centenária da Família Ferrari.

Essa construção histórica, localizada no interior do município, é um verdadeiro patrimônio cultural, preservando a arquitetura e o modo de vida dos imigrantes italianos que ajudaram a moldar a região.

O imponente casarão, cuidadosamente mantido pela família Ferrari, foi erguido por volta de 1900 para abrigar o casal de colonos Benedito e Elisabetha Ferrari.

A residência é um exemplo marcante da arquitetura dos primeiros tempos da colonização, evidenciando a força, a determinação e o espírito empreendedor desses pioneiros.


Um dos elementos mais distintivos da casa é a estrutura parcialmente sustentada por troncos inteiros e roliços de pinheiro, cortados e trabalhados manualmente no próprio local. Essa técnica, comum entre os imigrantes da época, confere ao imóvel autenticidade e solidez, além de integrá-lo harmoniosamente ao cenário natural ao seu redor.


Outro detalhe notável é o porão de pedras sobre o qual parte da casa foi construída. Esse espaço servia como local fresco e protegido para armazenar vinhos, salames e queijos, preservando a qualidade desses alimentos e refletindo as tradições culinárias trazidas da Itália. O porão, além de funcional, acrescenta um charme rústico que enriquece o conjunto arquitetônico.

A visita à Casa Centenária da Família Ferrari na Linha Bonita é uma oportunidade de mergulhar na história local, conhecer de perto aspectos da vida dos colonizadores e ainda saborear produtos artesanais elaborados no próprio local.

Durante nossa passagem, no entanto, encontramos o espaço fechado (possivelmente devido ao feriado de Carnaval ou às restrições impostas pela pandemia).


Mesmo assim, foi possível admirar sua beleza externa, registrar belas imagens e imaginar as histórias que aquelas paredes centenárias guardam.


Da Casa Centenária, bastou um curto trajeto para chegarmos ao Moinho Colonial Cavichion, outro ponto histórico marcante da Estrada Linha Bonita.

Fundado em 1920, o moinho preserva até hoje sua arquitetura original em pedra e madeira, típica das construções erguidas pelos imigrantes italianos que se estabeleceram na Serra Gaúcha no início do século XX. Cada detalhe de sua estrutura carrega a identidade cultural e a habilidade artesanal herdada desses colonizadores.

O destaque fica por conta da imponente roda d’água, que há 67 anos funciona de forma ininterrupta, movida pela força da água e mantendo viva a tradição da moagem de grãos. O som constante da engrenagem e o movimento ritmado da roda são um lembrete de como a tecnologia simples e eficiente de outras épocas continua desempenhando seu papel, conectando passado e presente em plena atividade.

Ao lado do Moinho Colonial Cavichion está a Capela São Pedro Claver, um marco religioso e comunitário da Linha Bonita. Inaugurada em 1961, teve a bênção de seu altar realizada em abril de 1969, tornando-se um importante ponto de encontro e devoção para os moradores da região.

A construção da capela foi fruto do esforço coletivo da comunidade. Com autorização do Padre Luís Manéa, foi criado o “Livro Ouro”, no qual eram registradas as contribuições financeiras obtidas por meio de visitas realizadas de bicicleta, a pé ou a cavalo, tanto na cidade quanto nas localidades vizinhas. Além disso, duas festas anuais — uma em abril e outra em setembro — ajudavam a arrecadar fundos, assim como rifas organizadas pelo grupo de jovens da Juventude Agrária Católica (JAC).

Curiosamente, a escolha do santo padroeiro foi marcada por uma disputa amistosa entre duas famílias, que defendiam, respectivamente, São João e São Pedro. Após votação, São Pedro venceu, mas como ele já era o padroeiro da paróquia, o então pároco, Padre Carmine, sugeriu São Pedro Claver, conhecido por sua dedicação missionária e pela defesa dos mais necessitados. A proposta foi aceita por todos, e assim nasceu a devoção que dá nome à capela.

Outro elemento importante da história local é a devoção a Nossa Senhora do Pedancino, cuja imagem foi trazida em 1928 por Joana Fioreze, fervorosa devota. A cada dez anos, a santa recebe uma celebração especial, com procissão em que é carregada por jovens moças acompanhadas de “anjinhos”, tradição que atravessa gerações, passando de mãe para filha e de avó para neta, mantendo viva a fé e o vínculo comunitário.


Seguindo pela Estrada Linha Bonita, chegamos às proximidades da Ervateira Marcon – Natural de Gramado, uma parada indispensável para quem aprecia um bom chimarrão e deseja conhecer mais sobre a tradição gaúcha na produção de erva-mate.


O local, profundamente enraizado na cultura do Rio Grande do Sul, oferece aos visitantes uma visão completa do processo artesanal, desde a colheita das folhas até a moagem e embalagem, transformando a visita em uma experiência educativa e sensorial. Infelizmente, durante nossa passagem, a ervateira estava fechada.


Retomamos então o passeio de moto pela Linha Bonita, atravessando um percurso repleto de colinas suaves, propriedades rurais e campos verdes que retratam fielmente a essência rústica e a beleza natural do interior gramadense.


Com seu ritmo tranquilo e paisagens encantadoras, a estrada proporciona uma imersão na serenidade e na riqueza cultural do Sul do Brasil, tornando-se um trajeto memorável para qualquer viajante.


Nossa próxima parada foi na localidade de Linha Nova, reconhecida como o marco inicial da colonização italiana em Gramado.


O chamado Marco Zero de Gramado assinala o ponto exato onde, em 1885, chegaram os primeiros imigrantes vindos de Caxias do Sul. Na época, a cidade vizinha enfrentava superlotação, levando muitas famílias italianas a cruzar o Rio Caí em busca de terras férteis e novas oportunidades.


Anos mais tarde, com a construção da ferrovia entre Taquara e Nova Petrópolis, a sede do distrito foi transferida para o local onde hoje está o centro de Gramado. A mudança se deu principalmente devido ao relevo acidentado de Linha Nova, que impossibilitava a passagem dos trilhos.


Na região, destaca-se a propriedade da família Bof, que preserva importantes referências históricas, como o próprio Marco Zero, o primeiro mercado e o primeiro açougue e abatedouro de Gramado.


Em frente à propriedade, ergue-se a Capela São José, a primeira igreja do município e símbolo da devoção ao padroeiro da cidade.


A atual Capela São José, inaugurada em 1953, é fruto do trabalho conjunto de imigrantes alemães e italianos que se estabeleceram na região.


Além de sua importância religiosa, representa a união e a determinação dessas comunidades que ajudaram a moldar a identidade de Gramado, RS.


Após conhecer o ponto onde Gramado nasceu, retornamos ao centro da cidade pelo mesmo trajeto da ida, apreciando novamente as belas paisagens rurais.



O interior do município faz jus ao nome Linha Bonita: uma região marcada por propriedades encantadoras, construções históricas e locais acolhedores que recebem visitantes com a hospitalidade característica da Serra Gaúcha.



Ao longo do caminho, há diversas oportunidades para experimentar a cultura local de forma autêntica, seja adquirindo produtos artesanais, saboreando cafés coloniais repletos de quitutes típicos ou ouvindo dos próprios descendentes dos fundadores da cidade as histórias que ajudaram a transformá-la em um dos principais destinos turísticos do Brasil.



Hoje, Gramado conta com cerca de 40 mil habitantes e obteve sua emancipação em 1954. O nome da cidade tem uma origem curiosa: no passado, a área onde ela se desenvolveu servia como ponto de descanso para tropeiros, que aproveitavam a sombra das árvores e os extensos campos cobertos de grama para repousar, inspirando o nome “Gramado”.



Antes de concluirmos o passeio pelas linhas Bonita e Nova, fizemos uma última parada em um local que Sayo já conhecia desde 2019: o Casarão da Família Visenzo Marcon.


Essa imponente construção histórica, conhecida na região como “Velho Casarão”, mantém viva a memória de Visenzo Marcon, imigrante italiano que chegou ao Brasil em situação de extrema pobreza. Ele e a esposa enfrentaram invernos rigorosos e chegaram a morar no oco de uma árvore antes de conquistar suas primeiras terras.


Com muito trabalho e perseverança, Visenzo construiu, em 1919, o casarão que hoje abriga a quinta geração da família.


Mais do que uma moradia, o imóvel é um símbolo da resiliência dos colonizadores italianos e um guardião das tradições e valores culturais que moldaram a região.


Após a visita, retomamos o caminho de volta ao centro de Gramado pela sinuosa e cênica Estrada Linha Bonita, levando conosco não apenas imagens memoráveis, mas também a certeza de que cada curva dessa estrada guarda fragmentos valiosos da história e da cultura da Serra Gaúcha.



De volta ao centro de Gramado, decidimos passar com a Formosa por outro ícone da cidade: a Ladeira Florida, popularmente conhecida como Rua Torta.


Com seu traçado sinuoso e canteiros floridos, essa charmosa rua tornou-se rapidamente um dos cartões-postais mais fotografados de Gramado.


Inspirada na famosa Lombard Street, de São Francisco (EUA), ela preserva o espírito do modelo norte-americano, mas com um toque tipicamente serrano, que a torna única e encantadora.

Ao final da Ladeira Florida, que desemboca diretamente na Praça das Etnias, encontramos o local ideal para estacionar a moto e seguir a pé.


Situada ao lado da Estação Rodoviária, a praça reúne importantes símbolos da herança cultural de Gramado, como a Casa do Colono e seus tradicionais fornos de pedra, onde são preparados na hora pãezinhos de linguiça, pães com queijo e cucas — bolo típico do Sul do Brasil, de origem alemã (Kuchen) — em diversos sabores.


Com os alforjes da Formosa abastecidos dessas delícias, despedimo-nos do charmoso centro e seguimos pela RS-235.

Logo após cruzarmos o pórtico de Gramado, o céu se fechou com nuvens carregadas e escuras. Sem hesitar, aproveitamos a primeira oportunidade para parar e vestir as capas de chuva, nos preparando para o que vinha pela frente.

A decisão foi acertada: após poucas curvas, fomos surpreendidos por um temporal intenso, que nos acompanhou até a divisa entre Nova Petrópolis e Caxias do Sul, marcada pela ponte sobre o Rio Caí. Ao atravessá-la, deixamos a BR-116 e seguimos pela RS-452.

Poucos quilômetros depois, encontramos um ponto sombreado à beira da estrada, perfeito para descansar e, com o sol voltando a brilhar, retirar as capas de chuva. Ali, aproveitamos para saborear os pãezinhos de linguiça recém-comprados.


Revigorados, retomamos a viagem em direção a Bom Princípio, onde acessamos a RS-122. Seguimos por um trecho de chuva intermitente até São Vendelino, onde pegamos a RS-446 rumo a Carlos Barbosa.



De lá, seguimos pela BR-470, atravessando as cidades de Garibaldi e Bento Gonçalves, no coração da Serra Gaúcha. Esta região, famosa por seus vinhedos e arquitetura típica, presenteou-nos com paisagens dignas de cartão-postal a cada curva.



Ao nos aproximarmos do Vale do Rio das Antas, paramos em um quiosque à beira da rodovia, atraídos por uma placa que anunciava a venda de bananas orgânicas.



Com a energia renovada após devorar algumas saborosas bananas e os olhos alimentados pela beleza do vale, prosseguimos pela estrada sinuosa que liga Bento Gonçalves a Veranópolis, um dos trechos mais belos da Serra Gaúcha, com vistas panorâmicas impressionantes.



De Veranópolis, seguimos até Nova Prata, onde deixamos a BR-470 para acessar a RS-324, estrada que nos levou diretamente a Passo Fundo, RS.



De lá, percorremos cerca de 80 km já conhecidos pela RS-135 até Erechim.



Encerramos o dia com a chegada à cidade, brindados por um pôr do sol espetacular, um final perfeito para mais uma viagem de moto inesquecível, reforçando a beleza singular do Rio Grande do Sul.


Acima o mapa com o trajeto percorrido no dia durante a viagem de moto entre Canela – RS e Erechim – RS.


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